Entenda o conceito, formatação e o cenário atual do mercado regulado e voluntário de carbono global.
No mundo atual, onde as preocupações ambientais estão cada vez mais presentes, a busca por soluções sustentáveis tem se tornado uma prioridade global. Nesse contexto, o mercado de carbono surge como uma ferramenta promissora para enfrentar o desafio das mudanças climáticas. Mas o que exatamente é o mercado de carbono e como ele funciona? Neste artigo, iremos explorar essas questões e fornecer informações essenciais sobre esse tema tão relevante.
O mercado de carbono é uma iniciativa que visa a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) responsáveis pelo aquecimento global. O princípio básico é bastante simples: criar um sistema que atribua um valor monetário às emissões de carbono – daí, a figura do crédito de carbono – incentivando as empresas a diminuírem suas emissões e a investirem em projetos de redução.
O conceito.
O funcionamento do mercado de carbono se baseia em dois conceitos fundamentais: os créditos de carbono e os limites de emissão. Os créditos de carbono são unidades de medida que representam a redução, remoção ou compensação de uma tonelada de dióxido de carbono equivalente (tCO2e). Esses créditos podem ser adquiridos por organizações e indivíduos que desejam compensar por suas emissões de gases de efeito estufa – chegando a um resultado carbono neutro.
Os limites de emissão, por sua vez, são estabelecidos pelos governos ou por acordos internacionais e definem a quantidade máxima de GEE que uma empresa pode emitir. Caso uma empresa ultrapasse esses limites, ela precisará adquirir créditos de carbono para compensar suas emissões excedentes.
Vale lembrar que o Brasil atualmente não tem limites de emissões de gases de efeito estufa impostos por lei a nenhuma empresa ou indivíduo.
"Com o Protocolo de Kyoto, pela primeira vez, a humanidade está instituindo um instrumento global de governança genuíno (...) Por atuar conjuntamente nesse instrumento sem precedentes, o primeiro componente de uma autêntica governança global, estamos trabalhando para o diálogo e a paz." Jacques Chirac, ex-presidente francês
A formatação legal.
A formatação legal do mercado de carbono teve suas bases estabelecidas através do Protocolo de Kyoto, um acordo internacional assinado em 1997 durante a Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 3). Esse acordo foi um marco importante no reconhecimento da necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa e estabeleceu metas obrigatórias para os países industrializados.
O Protocolo de Kyoto introduziu o conceito de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL, ou Clean Development Mechanism, CDM, em inglês), um dos principais pilares do mercado de carbono. Os MDLs permitiam que os países desenvolvidos investissem em projetos de redução de emissões em países em desenvolvimento, recebendo créditos de carbono em troca. Esses créditos podiam ser usados para cumprir parte de suas metas de redução estabelecidas pelo Protocolo.
No entanto, o Protocolo de Kyoto tinha uma abrangência limitada, uma vez que não incluía os Estados Unidos, o maior emissor de gases de efeito estufa na época, nem outros países em desenvolvimento importantes, como a China e a Índia. Isso limitou o impacto global das metas estabelecidas.
Em 2012, o Protocolo de Kyoto foi substituído pelo Acordo de Paris, um novo marco legal para ações climáticas globais. O Acordo de Paris estabeleceu metas mais ambiciosas para limitar o aumento da temperatura média global a menos de 2°C acima dos níveis pré-industriais e buscar esforços para limitar o aumento a 1,5°C. Além disso, o acordo estabeleceu o compromisso de todos os países em apresentar contribuições determinadas nacionalmente (NDCs, na sigla em inglês) que descrevessem seus planos de redução de emissões.
Embora o Acordo de Paris não tenha especificamente mencionado o mercado de carbono, ele criou um ambiente propício para o seu desenvolvimento e expansão. O acordo incentivou os países a adotarem políticas de precificação de carbono e a promoverem a cooperação internacional na implementação de ações de mitigação. Esses elementos abriram caminho para a continuidade e o crescimento do mercado de carbono em diferentes contextos e formatos.
Mercado Voluntário vs. Regulado.
Hoje, o mercado de carbono se divide em dois tipos: mercado regulado e mercado voluntário.
O mercado regulado é aquele regulamentado por estratégias e estruturas internacionais, regionais e nacionais de redução de carbono, como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo das Nações Unidas sob o Protocolo de Kyoto, o Esquema de Comércio de Emissões da União Européia (EU-ETS) e o Mercado de Carbono da Califórnia, por exemplo.
Cada tonelada de CO2 equivalente reduzida é medida em CERs (Certified Emission Reductions, ou Reduções Certificadas de Emissões). Esses CERs são gerados como créditos de carbono na fase de implantação do projeto; e são emitidos uma vez que a redução tenha sido creditada.
Projetos que desejam oferecer CERs no mercado precisarão ter suas reduções de emissões validadas por Entidades Operacionais Designadas (DOE, do inglês Designated Opertational Entity, que são validadores e verificadores avalisados pela ONU) e registradas pelo Conselho Executivo do MDL para garantir que reduções de emissões reais e mensuráveis sejam alcançadas.
Já no mercado voluntário, o objetivo é o uso dos créditos de carbono para compensar as emissões de organizações por políticas de responsabilidade ESG (sigla em inglês para pilares de impacto Ambiental, Social e de Governança), seja por filosofia de negócios ou motivada pela de terceiros. Essas organizações e indivíduos podem comprar créditos de carbono de VERs (Verified Emission Reduction, ou Redução de Emissões Verificadas) diretamente dos projetos socioambientais geradores, fundos ou intermediários.
É importante ressaltar o trabalho das organizações privadas certificadas pelas Nações Unidas para certificação das metodologias, procedimentos e regras de verificação de emissões e geração dos créditos no mercado voluntário, os chamados "standards". Dentre essas organizações e seus standards, estão hoje entre os mais reconhecidos no mercado voluntário a Verra e seu Verified Carbon Standard (VCS), o Gold Standard, o Social Carbon e, mais recentemente, o Global Carbon Council (GCC).
No mercado voluntário, os créditos seguem precificação livre de mercado, sendo os valores ditados por fatores da própria transação (como volume de créditos adquiridos), características do projeto socioambiental gerador (tipo, metodologia, cobenefícios, que acabam definindo o apelo de marketing e impacto aferido aos mesmos), ou dos créditos em si (como standard e vintage, que é o ano da sua geração, por exemplo), sendo inclusive comumente consumidos créditos registrados no MDL.
"Somos a primeira geração a sentir o impacto das mudanças climáticas e a última geração que pode fazer alguma coisa sobre o assunto." Barack Obama, ex-presidente americano
O atual cenário.
No cenário atual, a discussão em torno do mercado de carbono continua evoluindo nas negociações climáticas. Há debates sobre aprimoramentos nas regras e mecanismos, como a criação de um mercado internacional de carbono, a fim de promover uma maior integração e eficiência nas transações entre os países. O objetivo é estabelecer um sistema global mais robusto e abrangente que ajude a acelerar a transição para uma economia de baixo carbono.
De acordo com estatísticas recentes, o mercado de carbono tem apresentado um crescimento significativo nos últimos anos. Em 2020, o mercado voluntário movimentou aproximadamente US$ 320 milhões em transações, um aumento de 6% em relação ao ano anterior. Já o mercado regulado, que é o maior em termos de volume de transações, movimentou cerca de US$ 227 bilhões em 2019.
Além disso, o mercado de carbono tem se expandido geograficamente. Atualmente, mais de 60 países possuem algum tipo de política de precificação de carbono, o que demonstra um aumento na adoção dessa abordagem em nível global. Países como China, Canadá e Coreia do Sul estão desenvolvendo sistemas de mercado de carbono ambiciosos, enquanto outros países, como Brasil e Índia, estão explorando a possibilidade de implementar seus próprios programas.
É importante destacar que o mercado de carbono não é uma solução isolada para as mudanças climáticas, mas sim uma ferramenta complementar que pode impulsionar a transição para uma economia mais sustentável. Para alcançar resultados significativos, é necessário combinar o mercado de carbono com políticas públicas eficientes, investimentos em energias renováveis e mudanças nos padrões de consumo.
Em resumo, o mercado de carbono é uma abordagem inovadora que busca incentivar a redução das emissões de gases de efeito estufa. Através da precificação do carbono e da compra e venda de créditos, esse mercado cria um estímulo econômico para a adoção de práticas mais sustentáveis. Com seu crescimento constante e a expansão global, o mercado de carbono se torna uma importante ferramenta para enfrentar os desafios das mudanças climáticas e promover um futuro mais verde e resiliente para todos nós.
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